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Reflexões Sobre Carência e Transferência de Cuidados

 

Hoje, infelizmente, muitas pessoas — ainda que sem perceber — estão se afastando de si mesmas. As razões são inúmeras: o ritmo acelerado da vida, a pressão por resultados, as mudanças sociais e, principalmente, as transformações nos relacionamentos familiares. Não são todos, claro, mas é inegável que vivemos um tempo em que a carência afetiva se faz cada vez mais presente.

Recentemente, um fenômeno curioso e, ao mesmo tempo, revelador ganhou espaço: o movimento dos bebês reborn. Para quem não conhece, trata-se de bonecos criados para se parecerem com bebês de verdade. Eles são adotados por adultos — muitas vezes mulheres — que cuidam, alimentam, vestem e até os levam para passear. O tema pode causar estranhamento, críticas ou até julgamentos apressados, mas acredito que merece um olhar mais atento e empático.

Meu objetivo aqui não é julgar, mas trazer um ponto de atenção. O que está por trás desse movimento? O que ele revela sobre as relações humanas, sobre as necessidades emocionais e sobre os desafios das conexões familiares na atualidade?

O que leva alguém a buscar conforto em um boneco? Seria apenas uma moda passageira, ou um sintoma de algo mais profundo? Seria uma forma de suprir a ausência de vínculos reais, ou um recurso terapêutico para lidar com perdas e traumas?

São perguntas que merecem ser exploradas com respeito e curiosidade, e não com preconceito.

Nos próximos parágrafos, convido você a refletir comigo sobre os dois lados dessa história: o lado da carência, da solidão e da busca por afeto, e o lado do cuidado, da criatividade e da tentativa — ainda que simbólica — de preencher um espaço vazio.

Quando olho para esse cenário, vejo muito mais do que uma simples tendência ou uma curiosidade passageira. Enxergo, na verdade, um retrato silencioso das necessidades emocionais que muitos carregam, muitas vezes sem conseguir expressar em palavras. Não é sobre certo ou errado, mas sobre o quanto estamos como sociedade, lidando com nossas próprias carências e com a dificuldade de criar vínculos reais.

A verdade é que, em algum nível, todos buscamos acolhimento, pertencimento e afeto. Para alguns, essa busca se manifesta em relações familiares sólidas, amizades profundas ou projetos pessoais. Para outros, pode surgir de formas inesperadas, como o cuidado dedicado a um boneco. E, se olharmos com honestidade, quantas vezes também não tentamos preencher nossos próprios vazios com distrações, consumo, redes sociais ou até mesmo excesso de trabalho?

O que me chama atenção nesse movimento é o desejo genuíno de cuidar, de se sentir útil, de experimentar o afeto — mesmo que de maneira simbólica. Não cabe a mim, nem a ninguém, julgar o caminho que cada um encontra para lidar com suas dores ou para buscar conforto. O que podemos, sim, é olhar para esses sinais com mais empatia, tentando entender o que está por trás dessa escolha.

Mas é preciso sinalizar um ponto de atenção nessa reflexão: existe uma diferença relevante entre cultivar um afeto simbólico, que pode ser terapêutico ou até criativo, e substituir completamente o cuidado real, direcionando-o apenas ao mundo inanimado dos bonecos.

Um boneco não exige responsabilidade, direcionamento, flexibilidade e a presença ativa que uma criança real solicita — ele não desafia, não responde, não frustra. Por isso, é importante nos perguntarmos: esse afeto está suprindo uma falta de amadurecimento emocional? É um passo consciente ou pode ser uma fuga inconsciente das complexidades e da responsabilidade dos vínculos humanos ?

Se esse tipo de transferência emocional se intensifica a ponto de levar a pessoa a tratar o boneco como se fosse realmente uma criança — ocupando, no cotidiano, o lugar central de vínculo afetivo e tornando tênue a linha entre fantasia e realidade — é sinal de alerta. Nesses casos, pode haver uma tentativa de evitar o enfrentamento de dores reais, perdas ou responsabilidades, isso merece atenção profissional para compreender e cuidar das demandas emocionais dessa pessoa.

Nesse contexto entendo que, ao invés de apontar o dedo ou rotular comportamentos como estranhos, possamos nos perguntar: que tipo de vazio estamos tentando preencher? Que formas de afeto estão faltando em nossa vida cotidiana? E, principalmente, como podemos resgatar a conexão — primeiro com nós mesmos, depois com quem está ao nosso redor?

Acredito que, ao trazer esse tema para a reflexão, abrimos espaço para conversas mais profundas sobre o que realmente importa: o valor do afeto, da escuta, da presença e do cuidado mútuo. Não importa se esse cuidado acontece com um bebê real, um boneco, um animal de estimação ou um projeto pessoal — o essencial é reconhecer a necessidade humana de se sentir amado e pertencente.

À medida que vamos observando essas novas formas de buscar afeto, é impossível não pensar em como as relações familiares mudaram ao longo das gerações. Antigamente, havia uma convivência mais próxima, quase inevitável, entre pais, filhos, avós e netos. Hoje, com as rotinas aceleradas, a tecnologia mediando boa parte das conversas e as diferentes expectativas sobre o que é “ser família”, muitos vínculos acabam se tornando mais frágeis ou distantes.

Essa distância, muitas vezes, não é física, mas emocional. Quantas vezes estamos presentes no mesmo ambiente, mas cada um mergulhado em seu próprio mundo? Quantas conversas profundas deixamos de ter por falta de tempo, de coragem ou até mesmo de hábito? Não é raro encontrar pessoas que, apesar de viverem rodeadas de gente, sentem-se sozinhas, incompreendidas ou desconectadas de si mesmas e dos outros.

Nesse cenário, a busca por algo que traga conforto, companhia ou sentido se torna compreensível. O bebê reborn, para algumas pessoas, representa justamente essa tentativa de resgatar o cuidado, a ternura e até mesmo a inocência de um tempo em que o afeto era mais simples e espontâneo. Para outras, pode ser uma forma de lidar com perdas, preencher um vazio ou simplesmente experimentar um tipo de amor que, por qualquer motivo, não pôde ser vivido de forma plena.

É importante lembrar que cada escolha tem uma história por trás. Por isso, antes de julgar, vale a pena exercitar a escuta e a empatia. O que esse fenômeno pode nos ensinar sobre as necessidades humanas? Que alertas ele nos traz sobre o modo como estamos vivendo, nos relacionando e cuidando das nossas emoções?

Em resumo, é muito importante não ficarmos criticando ou julgando as pessoas, mas também devemos tomar cuidado para não achar que tudo é normal. É preciso perceber até onde uma pessoa está usando essas substituições de cuidado com vínculos reais para fugir da realidade. Isso é fundamental para que, se uma pessoa perceber que está assim, ela possa procurar ajuda e assumir o controle de sua vida emocional de forma mais consciente e saudável.

Talvez o maior convite desse tema hoje seja para que possamos olhar para dentro e para fora com mais sensibilidade. Perceber quando estamos nos afastando de nós mesmos, quando deixamos de dar atenção às nossas necessidades emocionais ou às dos que estão ao nosso redor. E, a partir desse reconhecimento, buscar caminhos para fortalecer os vínculos reais, seja com a família, com amigos, com a comunidade ou, principalmente, consigo mesmo.

Acredito que, ao abrir espaço para esse tipo de reflexão, damos um passo importante rumo a relações mais autênticas e saudáveis. Não se trata de condenar ou idealizar comportamentos, mas de compreender as razões que nos levam a buscar afeto de diferentes maneiras — e, quem sabe, encontrar formas mais conscientes e verdadeiras de suprir essas necessidades humanas!

Com carinho,

Foto de Êurenì RS Pálma

Êurenì RS Pálma

Terapeuta floral e professora de autodesenvolvimento, ajuda você a cuidar das emoções e alcançar objetivos.
Registro Internacional nº 02018.2181

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